quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Busca

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"O melhor ainda não foi escrito.
O melhor está nas entrelinhas."
(Clarice Lispector)
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O verso que busco, incessante, é aquele que não escrevi.
Verso não escrito, e por conseqüência, não lido, é verso que desconheço.

............Se não sei o que procuro, nunca o poderei encontrar.

Por vezes, leio um verso alheio e tenho a sensação de que ali estava ele,
escrito por outro, perdido para sempre.
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Em outras, quase que o reconheço em novos
– ou antigos – versos meus,
mas a impressão logo se desfaz
e retomo a busca.

É a busca que me faz tanto ler e escrever,
e estes quase-encontros-com-o-verso-perfeito
são o que dão cor a cada palavra,
que me fazem ansiar pela próxima frase.

O meu maior medo é encontrá-lo um dia.
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........................................................Tenho pavor de ser feliz.
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sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Aguardando

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"A solução para esse absurdo que se chama “eu existo”,
a solução é amar um outro ser que,
este, nós compreendemos que exista."
(Clarice Lispector)
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Troquei a espera ansiosa, pelo aguardo.
Mas aguardando, ainda não existo.

Quem espera, volta-se para o futuro...
Esperar... ter esperança... acreditar que aqui não se tem, mas que um dia se terá.

Desconfiada do futuro, não pude mais esperar.
Hoje, aguardo.

Aguardar, estar a guardar.
A espera coloca uma vida possível num futuro que talvez não possa ser;
o aguardo guarda o melhor de mim para ser vivido depois.

Minha existência e meu prazer agora estão comigo,
guardados no fundo das minhas gavetas
e não pendurados na parede, no calendário.

Mas por quanto tempo se deve guardar um prazer ou uma existência?
Guardados emboloram, envelhecem às vezes mais do que aquilo que usamos.
Envelhecem desperdiçados, não desfrutados...

Há um momento para se sentir, um momento em que o gozo vem,
não podemos guardá-lo para muito depois...

Por enquanto, guardo o melhor de mim, e ele ainda é fresco, mas até quando guardarei?
Até quando aguardarei?

A espera podia ser eterna, e eu jamais saberia que nunca existi,
o aguardo não:
um dia vou ter que abrir minhas gavetas.
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quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Não ter religião

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"Crê nos que buscam a verdade,
duvida dos que a encontraram."
(André Gide)
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Eu já tive religião.
Hoje, não tenho mais.
Não ter religião
é conviver com a insuficiência
das poucas respostas que temos.
A religião responde todas as perguntas.
Não deixa espaço para a dúvida.


Eu já amei...
“Quem ama tudo desculpa, tudo crê, tudo espera tudo suporta.”

Eu já fui criança...
“falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança,
mas então me tornei...”

Hoje, não amo, duvido.
Quem duvida também desculpa, crê, espera e suporta.

Porém, não tudo:
somente a própria dúvida
- inimiga da fé e falsa amiga da ciência.
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