segunda-feira, 23 de março de 2009

Verborragia

.
"Por honestidade ele quis lhes esclarecer
que sabia que era o sol que inchava suas palavras,
e as tornava tão esturricadas e grandes;
e que era o sol insistente,
com seu silêncio insistente,
que o fazia querer falar."
(Clarice Lispector)
.
Na caverna, os assuntos fizeram-se tantos que ela se viu sem ter o que dizer.
O silêncio, então, passou a incomodá-la com desesperadora sutileza.
.
Ela falava, falava, falava, mas o silêncio, imóvel, permanecia.
Ela gritou.
O silêncio, numa ironia quase que cruel, manteve-se inabalável.
.
Foi então que percebeu que era o próprio silêncio que enchia sua boca com palavras.
O silêncio falava o quanto era ela impotente: ninguém pode pedir ao silêncio que se cale.
Ela também não podia.
.
Compulsivamente - como quem já perdeu aquela fome que o acompanhava por horas - ela comia as palavras que o silêncio lhe impunha e - de boca cheia - umas engolia, outras lhe sobravam: vomitava.
.
As palavras do silêncio, faziam lama no chão, enquanto ela, verborrágica, sucumbia.
.

Nenhum comentário: