"...era fácil se perder por entre os sonhos,
e deixar o coração sangrando até enlouquecer."
(Filipe Catto)
Com
força, ela batia e repetia,
com
a crueldade das vozes que ressoam de dentro:
“Engole
esse choro."
“Engole
esse choro, menina.”
“Engole-esse-choro!”
Sabedoria
de mãe:
“Engole
esse choro! Rápido, engole esse choro!”
...
que dói demais te ouvir chorar assim.
“Tudo
tem limite!”
Engoli,
engoli.
Pela
faringe desceu amargo,
alojou-se
no meu pulmão.
Fez
faltar-me o fôlego.
Fez
faltar-me a voz.
Por
anos, tenho gestado o choro engolido.
Por
anos, em silêncio, o alimento nos pulmões.
Já
me vêm as contrações, há alguns dias.
Um
dia, em um ato de coragem involuntária,
por
instinto, farei força.
Sim,
as dores de parto os farão nascer.
Nesse
dia, pedirei a ela que retorne e me venha ensinar.
Sozinha,
com o grito nas mãos,
esperarei
que ela me salve, a mim e ao recém-gritado.
Espero
que ela venha antes
que
em desespero dele eu me desfaça.
Espero
que ela venha,
pois
não saberei contê-lo,
pois
em meus braços ele gritará demais.
Espero
que ela venha,
me
contenha,
nos
interdite,
ou
me ensine como bater e gritar até que ele se engula.
Sozinha,
não saberei impor os limites.
E
se ele os atravessar, sangraremos para sempre.
Uma
coisa, o tempo me ensinou:
nossos
gritos são gestados nos pulmões.
Um comentário:
Dói de ler, mas muitas vezes, só com a dor se consegue compreender alguns processos....e não há como evitar, é deixar a dor entrar....
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