quarta-feira, 25 de junho de 2008

Paciência...

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"Tomar conta do mundo exige também muita paciência:
tenho que esperar pelo dia em que me apareça uma formiga."
(Clarice Lispector)
"E até quando o corpo pede um pouco mais de alma
(...)Eu finjo ter paciência..."
(Lenine)

Um dia ouvi dizer que é preciso ter serenidade para aceitar as coisas que não podemos mudar.

Confesso: fingi que acreditei. E o que me aflige é conviver com essa farsa. Não acredito nas coisas que não podemos mudar, por isso não tenho paciência quando elas teimam em aparecer, fingindo que existem.
Para ser sincera - já que reclamei da minha mentira - só conheço uma coisa que não se pode mudar, que é perene, que é em si, que é essencial, eterna, e que pede de nós essa serenidade, essa aceitação, essa paciência. Ela, eu aceito, serenamente!

Curioso: os que mais pregam que as coisas que não podemos mudar existem, são os mesmos que afirmam piamente que essa única coisa que permanece para sempre não existe e não passa de um momento, de uma passagem, de uma transição.

Perdi a paciência!
Qual? Aquela que eu nunca tive?
Onde? Por causa de quem?
O que é que me impede de fingir que eu aceito? O que é que me faz descer do salto, do palco, sair do papel de quem aceita algumas coisas como imutáveis e passíveis de serem aceitas com serenidade?

Confissão: são aqueles que não mudam!
Eu não consigo me fingir paciente em relação aquilo que não muda. Eu tenho serenidade e paciência, sim, mas é para acompanhar a mudança, demore ela o quanto demorar, vá por qual caminho for...mesmo que mude para o pior... eu espero o dia chegar, serena e paciente! Degustando cada pedaço suculento da ansiedade que me acompanha...

Eu espero, desde que caminhando. Não me peça para esperar sentado; para ver o mundo sentado..."esperando a chuva passar..." Eu espero no movimento da dança, o tempo da fala de cada ator, a hora em que a formiga entrará em cena. Eu espero porque eu sei que as formigas andam em fila, e se comunicam antes de mudarem de direção... Eu espero porque eu sei que caiu uma peça de dominó lá atrás e demora alguns minutos até que efeito repercuta aqui. Mas eu não gosto de ver o jogo parado, de ficar ouvindo o silêncio dos que não tem nada a dizer... Eu gosto do silêncio que precede a fala, ou que paira depois do amor... com ele eu tenho toda a paciência que o mundo exige, que a vida e a alma pedem.

Paciência morta eu não tenho. Tenho paciência com a morte, sim, e com todo o nada que vem depois dela. Só ela é digna dessa serenidade, porque ela é a Morte, ela é o momento de ficar deitado para sempre, de não ser mais, de silenciar. Ela é bonita por causa da serenidade que ela contém. Eu não tenho paciência com os que tiram essa beleza dela, e a enchem de atividade: de toda atividade que uma vida em silêncio não conhecia.

O que ainda não morreu, por favor, que esteja vivo! Caso contrário, não vou fingir: eu não tenho paciência!

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2 comentários:

-d.c.- disse...

"Nesta vida, pode-se aprender três coisas de uma criança: estar sempre alegre, nunca ficar inativo e chorar com força por tudo o que se quer."

Paulo Leminski

(curioso: há mais vida aí dentro do que eu imaginava. e está transbordando... gosto disso.)
d.

Raquel Zanelatto disse...

eu sempre me surpreendo com o que transborda...por vezes dos outros em mim, por vezes de mim nos outros, por vezes de mim em mim mesma... :)